Escavações realizadas em sítios arqueológicos do Serrote do Velho Chico e Fazenda Salão, na região de Curaçá (a 592 km de Salvador), revelaram possível encontro de comunidades indígenas em estágios diferentes de evolução. A hipótese foi levantada por pesquisadores, a partir dos fragmentos de cinco urnas funerárias que evidenciavam a utilização de duas técnicas distintas no mesmo sepultamento. O trabalho arqueológico foi realizado entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2009.
Localizada no semiárido baiano, a cidade de Curaçá fica às margens do Rio São Francisco, fator que, segundo os pesquisadores, explica a presença de povos indígenas na região há aproximadamente 3 mil anos. Eles acreditam que o rio confere à região a característica de ter sido tanto um corredor de passagem, quanto área de fixação de grupamentos humanos. A descoberta das urnas fortalece a hipótese de que grupos, em distintas fases de evolução, tenham se encontrado na localidade, ou o grupo vivenciava um processo de convergência cultural, fato até então inédito na pesquisa arqueológica.
Pinturas - No Serrote do Velho Chico foram encontradas pinturas e gravuras, lascas para a produção de instrumentos de pedras, restos de alimentação, como ossos de animais caçados, uma fogueira e restos de um sepultamento. Na Fazenda Salão foram achados a céu aberto cinco sepultamentos visíveis pelas cerâmicas descobertas, provavelmente pela erosão.
“Os ossos estavam muito fragmentados, mas permitiram identificar os esqueletos de três adultos e duas crianças. Os corpos foram depositados diretamente no chão e cobertos com recipientes cerâmicos na parte da cabeça”, explica o arqueólogo e coordenador do Projeto Mata Branca, Carlos Etchevarne. Segundo ele, esse poderia ser um padrão de enterramento circunscrito regionalmente, considerando que na década de 60 outros enterramentos foram identificados da mesma forma na mesma região.
As descobertas feitas revelam que em todas as crianças existia um colar, cada um com até 200 contas feitas com material ósseo e os adultos tinham os “tembetás”, feitos de quartzito esverdeado, material usado pelos índios no lábio inferior, geralmente como atributo masculino. “São três ‘tembetás’ esverdeados bem- trabalhados por polimento e um adorno circular no mesmo tipo de rocha, possivelmente auricular”, informa. Para Etchevarne, esses achados representam para o País o começo da construção de uma história regional anterior à chegada dos colonizadores, história que só é possível ser contada pela arqueologia.
“Com as descobertas, queremos incentivar o turismo científico e ecológico em Curaçá”, afirmou Dário Tavares Santos, antropólogo e técnico do projeto.
Outros achados – Mas esses não foram os primeiros achados em Curaçá, já tendo registro de outros sítios não só na região, como em todo a Bahia. “Nosso Estado tem um potencial riquíssimo em termos de patrimônio arqueológico à espera de ser pesquisado, preservado e bem utilizado”, afirma o arqueólogo.
O conjunto de materiais coletados (lítico, cerâmico, ósseo, biológico e carvão de fogueiras) foram levados ao Laboratório de Arqueologia que fica na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (São Lázaro) em Salvador, onde estão sendo catalogados, numerados e analisados para estabelecer contextos culturais entre os dois sítios: na Fazenda Salão e no Serrote do Velho Chico.
Caminhando pelo Serrote do Velho Chico, em sua propriedade, a Fazenda Las Vegas, José Reis Brandão, 66, conta histórias que conhece e muitas das quais fez parte e que revelam sua paixão pelo conhecimento em arqueologia e antropologia que surgiu junto com as primeiras descobertas datadas de 1960 em Curaçá e reconhecidas cientificamente. Ele lembra da visita do arqueólogo Valentin Calderon à região e que, até aquela data, nenhuma escavação havia sido realizada. “A partir daí, muitos vieram de vários estados para ver e pesquisar”, conta José Reis.
Fonte: A tarde online
Nenhum comentário:
Postar um comentário